Meister Eckhart disse: “Nós lemos no evangelho que Nosso Senhor evitou a multidão e subiu a montanha. Então ele abriu sua boca e os ensinou sobre o reino de Deus.”(Mat. 5:1) Aqui é dito que ele deixou o rebanho, o qual significa a diversidade e subiu a montanha: Por que vocês estão agora aqui, por que vocês não estão na cidade? Vocês se separaram de seus pais, amigos e conhecidos e vieram sozinhos para cá, aqui está a montanha. O instituto Kamalashila é a montanha. E vocês subiram a montanha.
Vocês já ouviram a voz de Deus? Talvez agora ainda não, mas talvez hoje à noite. Nós precisamos ainda um pouco de tempo para nos prepararmos, isto significa um processo. Primeiro nós precisamos nos preparar, isto quer dizer que nós precisamos cortar todas as nossas relações exteriores. Segundo - nós precisamos preparar o nosso ambiente. O ambiente aqui é muito bom. Isto aqui é um perfeito centro de meditação. Porém isto ainda não é o bastante. O problema somos nós próprios. Algumas vezes temos o verdadeiro silêncio a nossa volta, e então o silêncio é tão barulhento, que não conseguimos dormir à noite, assim chegamos a ter saudade dos ruídos e barulhos da cidade grande.
Então o ambiente não é suficiente, nós precisamos manter o silêncio dentro de nós mesmos, nossa própria natureza precisa ser silenciosa, para isso precisamos controlar nossos desejos e cobiças. Existem cinco tipos de desejo: O primeiro é o desejo de comer; segundo é o desejo de dormir. Para continuar a viver, precisamos comer e dormir, mas demais também não é bom, por isso precisamos controlar ambos. O terceiro é o desejo por sexo, que é um campo importante e sagrado. Uma relação sexual pode nos dar muito prazer, mas muitas vezes depois provoca infelicidade. Quando comemos e dormimos estamos à sós. Na sexualidade, no entanto, estamos sempre envolvidos com um companheiro, por isso precisamos controlar o sexo. O quarto é o desejo por coisas materiais e o quinto é o desejo por status e fama. Estes cinco tipos de desejos estão ligados aos cinco órgãos dos sentidos, os olhos, os ouvidos, a boca, o nariz e o tato. Através do controle destes cinco sentidos podemos preparar o nosso ambiente. E então podemos de fato nos ocupar com o corpo e a alma.
A prática do Zazen significa tornar-se Buda. E tornar-se Buda significa que cada célula, toda a carne e a pele tornam-se Buda através do Zazen. No início temos sempre dores, isto é natural, é o processo inicial. Nosso corpo é deformado, por isso temos no começo tais dificuldades. Depois vem a respiração. Uma respiração lenta, profunda e tranquila. E se nós assim respiramos, então esta é a respiração de Buda. A respiração está em direta ligação com nossas emoções e estados de espírito. Quando estamos muito zangados ou muito nervosos, então temos uma respiração ofegante. Quando choramos, temos uma respiração soluçante. Muito lenta, muito calma, e profunda, esta é a respiração de Buda. Façam-na! Se vocês o conseguirem, vocês serão Buda. “Buda, eu?” “Sim”, “Eu, não”, “Sim, agora, você é Buda” “Buda sem auréola”. A respiração está em relação direta com o espírito e quando a respiração está calma e pacífica, então o espírito também está calmo e pacífico.
“Moisés foi para dentro de uma nuvem e subindo na montanha ali ele encontrou a Deus e na escuridão ele achou a verdadeira luz.” (Ex. 20:21) Moisés subiu na montanha e entrou na nuvem. Lá ele enxergou nada, mas nesta escuridão ele achou a verdadeira luz. Subindo a montanha ele achou Deus. E assim nós precisamos subir a montanha. Eu disse que o Instituto Kamalashila é uma montanha e aqui nós precisamos subir a montanha e aqui precisamos ouvir a voz de Deus e aqui achar a Deus. Para nós, achar Deus significa achar a nós próprios. Achar-se a si próprios. Seu verdadeiro Eu, que existia antes de nascer. Nós nos lembramos de um Koan do sexto Patriarca. “Quando não pensamos nem no bem e nem no mal, qual é então a nossa face original?” Quando nascemos nós já temos o pecado original. Nós já somos maculados, por isso precisamos voltar à origem, antes do tempo, quando nasceram nosso pai e mãe. Este estado se chama corpo de Buda cósmico. Para isso precisamos de prática, naturalmente também compreensão e teoria. Mas isto não é ainda suficiente, por isso não devemos somente mudar corpo e espírito, mas sim nosso subconsciente, o campo desconhecido. Neste campo desconhecido temos muitos tipos de Karma em estoque.
No Sansuikyo Mestre Dogen diz que há quatro tipos de água. Para nós,água é água, desde que possamos bebê-la. Para os pobres demônios famintos ela não é potável. Para eles
água é pus com sangue e fezes. Para os peixes a água é como um palácio, e o lar, o espaço vital. Se dissermos para o peixe: a sua casa flui, então o peixe diria: “minha casa não flui”. Para anjos e seres celestiais a água é como espelho ou pedras preciosas brilhantes. Depende pois de nosso estado de consciência, de que modo nós vemos as coisas. Mesmo que todos estejam vendo a mesma coisa, cada um tem uma concepção diferente. Por isso devemos nos purificar, e neste momento nós achamos Deus.
“Ele subiu a montanha. Isto quer dizer que Deus com isto mostra a sublimidade e doçura de Sua natureza, da qual deve sair fora tudo aquilo que é criatura”
Subir a montanha significa sublimidade, refinamento. Este estado é muito elevado e esta prática é muito dolorosa, como galgar uma montanha não é muito fácil. Trata-se de uma montanha muito alta. Assim é a prática e o caminho do Zen. Muitas vezes este caminho muito escarpado não é para todos. Precisamos para isso tomar uma clara decisão. Linha reta, sem rodeios e as vezes também muito frio e estamos muito sozinhos. Muitas vezes ficamos primeiro com medo de estar sozinho, mas depois que nos confrontamos, nos sentimos bem. Quando estamos sozinhos, nos sentimos muito bem com a solidão. Um Mestre Zen disse que quando estamos a sós sentados no Zazen, somos tão somente um e isto não é pouco. Quando sentamos em Zazen com trezentas ou até mil pessoas, não é demais. Isto significa que quando simplesmente sentamos então estamos no centro do universo e todo o universo é simplesmente nós mesmos. Esta é a maravilha do zazen. Cada um é o centro do universo. E todos os outros são uma parte de nós próprios. Possivelmente vocês agora entendem o significado de montanha. Para um mosteiro Zen sempre existem dois tipos de nomes, como também para os monges. Mestre Fuyodokai significa Dokai da montanha Fuyo. Todo monge Zen tem dois tipos de nome, o nome do Dharma e o nome do caminho da prática. Da mesma maneira cada templo tem dois nomes, o nome do templo e o nome da montanha. Antigamente todos os templos e mosteiros estavam nas montanhas. Também hoje cada templo na cidade grande tem dois nomes: o nome do templo e o nome da montanha, porque o templo é ele próprio uma montanha, o templo é a própria montanha. E aqui está a montanha Kamalashila. Nós estamos em cima da montanha e as nuvens estão embaixo de nós. Quando a montanha é muito alta, as nuvens estão abaixo de nós e nós estamos sozinhos aqui. E estar sozinho significa que somos o centro do universo e o universo todo somos nós, além disso não existe nada.
Por favor, experimente no próximo Zazen: vocês são o centro do universo e tudo está no universo, o universo interior são só vocês próprios. Esta é a montanha do Dharma.
“Há muitos casos em que um imperador visitou uma montanha para reverenciar sábios e buscar conselhos dos religiosos. Nessas ocasiões eles respeitam os sábios como seus mestres e prostram-se na frente deles, costumes sociais e hierarquias não são obrigatórios. Indiferente quão grande seja a virtude e o poder do imperador, sábios não se comovem com isso. Esses, que vivem nas montanhas, estão completamente separados da sociedade.
Uma vez o imperador Ko, da China, visitou o ermitão Kosei na montanha Kodo. Ele se aproximou dele de joelhos e curvou a sua cabeça até o chão, para mostrar ao ermitão a sua humildade.
Shakyamuni deixou o palácio de seu pai e foi para as montanhas. O rei não alimentou ódio, não ficou irritado sobre o comportamento de seu filho e não discutiu a honestidade daqueles que iam até as montanhas para ensinar o príncipe.
As doze práticas rigorosas de Shakyamuni realizaram-se quase totalmente nas montanhas. Nós devemos saber que as montanhas não pertencem ao mundo dos deuses e nem ao mundo dos homens. Não procure se aproximar das montanhas, enquanto você usar somente sua limitada capacidade humana”, assim dizia Mestre Dogen.
Existem muitas histórias sobre mestres, como por exemplo a história de um mestre. Ele vivia nas montanhas e o imperador queria convidá-lo para o seu palácio. Ele mandou um mensageiro com o seguinte convite: “Por favor venha a mim no palácio”. Mas ele não foi; três vezes ele foi convidado, mas o mestre não foi lá. Quando um ministro foi até a montanha para ir buscá-lo, ele encontrou um homem pobre, que em um fogo de folhas secas cozinhava batatas doces. Ele estava de cócoras na frente do fogo e assoprava com bochechas cheias para dentro das chamas para aumentá-las. Seu nariz corria. O Ministro falou: “Mestre, Mestre!” “Espere, que eu estou ocupado”, disse o mestre e ele continuava assoprando o fogo. O
imperador mudou de ideia de convidá-lo ao palácio mas com muito respeito e saudades ele o imperador mandou plantar batata doce na montanha para que não faltasse batata doce para o Mestre. O caso do Mestre Yakusan Iguen também o imperador enviou um ministro o convidando para a corte, mas o Mestre não ligou com isto. O ministro ficou aborrecido e disse: “Este Mestre não é tão formidável, eu vou me embora.” Quando ele se virou para ir embora, o Mestre Yakusan o chamou: “Ministro.” “Sim,” disse o Ministro, “Por que você respeita seus ouvidos, mas não seus olhos?” Vocês entendem? Quando o ministro o olhou, ele pensou : “Ah, ele não é tão importante” Quando ele ouviu a palavra “Ministro”, ele respondeu “Sim”, isto significa que seus ouvidos reagiram sem dúvida. Neste momento o ministro entendeu um pouco, e ele voltou para o Mestre Yakusan e perguntou: “Qual é o caminho do Buda?” isto significa: o que é Buda? E Yakusan respondeu: “As nuvens estão no céu e a água está aqui na garrafa.” Após isso o ministro se tornou um discípulo e começaram a praticar.
Este exemplo do Mestre Yakusan é só um de muitos. Buda Shakyamuni deixou o seu palácio e foi para as montanhas. Moisés foi para a montanha e Jesus também e agora nós aqui também vemos a montanha.
Por isso, quem quiser receber o ensinamento de Deus, precisa subir a montanha.
Com a prática do Zazen vocês podem receber o ensinamento de Deus, minha palestra aqui não é tão importante. Com Zazen vocês podem diretamente encontrar a Deus.
capítulo do livro A Virgem e a Mulher de Pedra - mestre Ryotan Tokuda Igarashi